Para além das redes mesh, pensar em redes e interfaces locais !

Porque não pensar em códigos e interfaces, uma “rede social”, ou então, um agregador de redes locais onde cada nó deixe de ser um individuo, mas os nós serão  as casas, as unidades de moradia, trabalho, e outros processos coletivos  (ocupações, centros comunitários, centros culturais) onde as pessoas vivem. Dessa forma, uma rede onde o cotidiano das pessoas, o lugar onde elas vivem está implicado, e menos o ego, a história individual desta pessoa, modelo que prevalece nas redes sociais proprietárias mais usadas e que impõe uma lógica da audiência e da propagação (número de likes e retweets)

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A internet é uma grande ferramenta de produzir encontros. Podem ser reencontros de velhos amigos, ou novos encontros de pessoas que descobrem ser interessadas no mesmo assunto. Esses encontros podem ser anônimos, com identidades inventadas ou reais. Eles podem se realizar através de troca de mensagens, troca  de arquivos, trocas financeiras ou de uma forma variada de interações. Não há dúvida que a Internet,  sendo um laboratório de comunicação, onde diversas aplicações e camadas vêm sendo criadas para permitir conversações dos mais diferentes tipos, facilitou demais a possibilidade de pessoas que vivem remotamente se encontrarem para realizar algum tipo de transação virtual, encontros, interações, criação de narrativas coletivas,  etc;  modificando todo o mercado da intermediação. E isso não quer dizer que as pessoas  deixaram de se encontrar  presencialmente. Pelo contrário, como podemos ver nas revoltas globais conectadas dos últimos anos, esses encontros se tornam uma camada a mais que podem se transformar em encontros na camada presencial das mais variadas formas.

Por outro lado, as novas formas de intermediação são capazes de criar também camadas que criam formas de controle e vigilância cada vez mais sofisticadas, isto porque a Internet existe no interior de uma estrutura física de comunicação controlada por governos e corporações. O digital é controle. Por isso é muito importante pensar nas soluções em rede mesh, arquitetura da rede em que cada nó, se torna um um ponto de conexão da rede, e conectando um a outro desses nós, pode-se pensar em redes verdadeiramente ponto a ponto (P2P), que não dependam de uma infraestrutura centralizada para conectar os usuários. Existem vários projetos experimentando soluções técnicas para efetuar redes mesh , e essa questão da autonomia das redes debate que envolve a implementação do rádio digital, no do DRM_Brasil, mas sua implementação de forma global ainda é muito restrita, até porque pouco incentivada por corporações e governos. Mas é importante pensar  que redes mesh e estruturas p2p são importantes não só por uma questão de segurança e privacidade (e parece que o Departamento de Estado dos EUA já apóia alguns projetos, levantando a dúvida se já podem estar implementando back doors em roteadores) , ou mesmo por uma questão estratégica de comunicação (como por exemplo, manter a comunicação diante de um desastre natural) elas podem incentivar a criação e invenção de relações em rede locais, que se efetuam no território da convivência cotidiana – ou seja podem instigar, reforçar e reinventar formas comunitárias de convivência. 

Mas para além das redes mesh, seria interessante para relações p2p locais , um movimento de experimentação no campo do código e das interfaces. A questão é: se ficou tão fácil se comunicar com alguém geograficamente distante, mas próximo na camada afetiva da Internet -como no interesse em determinado assunto, ou na vontade de trocar determinado arquivo de forma descentralizada – porque ainda é tão complicado criar essas relações na vizinhança? Ainda há na dimensão do dia-a-dia certas limitações nesses encontros na dimensão do território em que a gente vive e circula. Por exemplo, se quero jogar certo jogo online, não consigo saber se há alguém perto de mim geograficamente que tem a mesma vontade. A partir desse desejo em comum que novos laços poderíamos inventar? Podemos aplicar para qualquer situação. Baixar um filme, comprar um artigo usado, fazer uma escambo, creches parentais, empréstimos, eventos coletivos,  mobilizações locais. Somos capazes de criar uma grande mobilização nacional de forma descentralizada, mas ainda temos dificuldade de criar uma relação de vizinhança (principalmente nos grandes centros urbanos)

Porque não pensar em códigos e interfaces, uma “rede social”, ou então, um agregador de redes locais onde cada nó deixe de ser um individuo, mas os nós serão  as casas, as unidades de moradia, trabalho, e outros processos coletivos  (ocupações, centros comunitários, centros culturais) onde as pessoas vivem. Dessa forma, uma rede onde o cotidiano das pessoas, o lugar onde elas vivem está implicado, e menos o ego história individual desta pessoa, modelo que prevalece nas redes sociais proprietárias mais usadas e que impõe uma lógica da audiência e da propagação (número de likes e retweets)

Em uma ferramenta assim, uma série de aplicações poderiam ser criadas ferramentas para mutirões, empréstimos, trocas, compartilhamento de bens, transações financeiras em moeda virtual (bitcoin?), hortas comunitárias, incentivo da economia local, almoços coletivos, vaquinhas, marcar uma futebol  na praça, e o mais legal: tudo o que não foi inventado ainda. Uma rede do mutirão e da minga. Ou uma rede que possar juntar os mundos do software livre e código aberto com o mundo do cooperativismo – que fortaleça economias locais.  Uma rede que eu possa me relacionar relacionar afetiva e  geograficamente. Através de alguma forma de indexação (por CEP) ou geolocalização essa rede permitiria uma série de interações entre nós físicos que abrirão espaço para novas relações de vizinhança.Dessa forma tentamos pensar o grande paradoxo de a Internet permitir que eu encontre grandes afinidades mundo afora, mas não permitir saber se um dos meus vizinhos geográficos tem a mesma intenção  – e a partir daí  permitir vários desdobramentos de interações.

Me parece que essa ideia, implementada como software livre, de modo federado ao estilo Diaspora – com as garantias de privacidade necessárias, mas com API aberta, e interface intuitiva, poderia abrir esse campo de experimentação muito frutífero. Ela poderia antecipar as relações locais que as redes mesh prometem, mas poder rodar seu código tanto em redes mesh autônomas e independentes  ou mesmo na camada da Internet centralizada . Me parece que as experiências do Flok Society no Ecuador , 15M e PartidoX na Espanha, são ótimos lugares para se pensar na construção de uma interface desse tipo. 

Aí eu descobri essa “startup” americana Nextdoor.com que implementa uma coisa similar ao que descrevi acima, mas pelo viés do conceito descrito acima ela tem alguns problemas. O primeiro é que é centralizado e proprietário. (a autenticação é centralizada – (inclusive através de cartão postal). E me parece muito ligado a cultura americana de subúrbios, preocupação com segurança e relação com subprefeituras e a administração local . Mas vale a pena estudar a implementação que os eles estão pensando. No caso de uma ferramenta em código livre, o principal desafio, seria uma autenticação das casas descentralizada, em que os vizinhos pudessem confirmar a autenticidade dos usuários (da mesma forma que os servidores públicos de chaves) . E como pensar em prédios? Como garantir privacidade da conversas entre os nós? Creio que o esforço de programação para criar um código e uma interface para isso deva ser enorme, mas unindo esforços de hackers e grupos espalhados pelo mundo que se interessam pela privacidade e autonomia das redes, ele pode ser viável.

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Uma idéia complementar para implementação é que cada casa- ou nó da rede – pudesse ter uma interface interna : As pessoas não serão excluídas, elas se tornarão sub-nós, que habitam essa casa. E dentro desse nó podem existir sub-relações entre os sub-nós. Uma interface de ferramentas de comunicação cotidiana de um espaço, funcionaria como um incentivo para que as pessoas de um espaço, entrem em conjunto na rede, para incentivar que as mesmas participem da outra camada de relações entre as casas de forma coletiva. Outra idéia é permitir que cada um desses nós possa se auto-definir como um prestador de serviço, então, se procuro um serviço, posso achá-lo no meu vizinho ao lado em vez de clicar no primeiro anúncio do Google. Essa idéia poderia auto-financiar o custo de servidores e de infraestrutura de redes mesh locais.

Axé!!!!!!

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